sábado, 20 de novembro de 2010

O abraço que empurra

Eu passo o dia feito um gato, cavando. Cavando pra cagar, tapando pra esconder. Desculpa a comparação, mas isso me soou bem comparado às merdas que eu faço dia após dia.
Eu também tento cavar pra encontrar alguma coisa nos teus olhos, pra tentar abrir, ajeitar lá dentro, vê se tu volta a enxergar direito. Eu tento me debater, tento dançar, tento girar, rodopiar, onde eu estiver e onde tua vista alcançar. Mas nada adianta. Os olhos não reagem mais, e a cabeça só faz um gesto negativo com um sorriso amarelo na boca.
Se eu pudesse abrir teu cérebro, apagar a memória, voltar uns meses atrás... Se eu pudesse qualquer coisa, eu te fecharia dentro de mim, eu me fecharia dentro de ti e nada mais podia ser aberto. Se eu pudesse qualquer coisa... eu escolheria sofrer quietinha por te amar tanto, mas poder te amar e depois de sofrer quando não dá pra te ver, ser a pessoa mais feliz do mundo quando dá pra ver os teus olhos e os teus cílios curvos. E pretos. O mundo precisa da luz dos teus olhos pretos pra não ser tão escuro.
Eu passo o dia tentando me enfiar embaixo dos teus braços e a noite pensando se eu vou ter coragem de fazer isso. Eu passo a noite planejando ser mais grossa amanhã, ser mais dura, mais orgulhosa, mas eu nunca senti isso antes, nunca me descontrolei tanto antes: as palavras nunca são as mesmas do ensaio, e o abraço sempre vem, mesmo quando eu digo que não vou encostar. É impossível não encostar na tua pele de papel pardo. Papel pardo, mas macio.
Eu fico o tempo todo tentando cavar um abraço, que nunca surge de ti. Um abraço que, se der, eu conquisto, com esforço. Todo o meu maior orgulho do mundo se vai por um ralo que abre no meio do lugar onde eu estiver. Todo o meu orgulho se transforma na vontade de estar encaixada no teu corpo que uma vez já quis se encaixar também. Eu não sei o que sobrou pra ti, mas pra mim sobrou tudo. Sobrou cada coisa e cada não coisa. Sobrou o que aconteceu e o que não aconteceu. Acho que eu tratei de guardar até as tuas lembranças.
Eu fico o dia desnorteada pra tentar fazer alguma coisa que eu nem sei qual é, tem algo pulando dentro de mim esperando alguma coisa. Mas nada acontece. E o abraço?
Quando a gente se abraça... Quando a gente vai se abraçar, eu penso “Ufa!”. Mas a agonia não para por aí: alguma coisa nesse abraço me empurra pra tão longe...
Um longe quase impossível de voltar a ser perto, e já foi tão perto...

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